O caso Felca: saiba como a CHINA protege suas crianças na internet
- Nino Rhamos
- 12 de ago.
- 3 min de leitura
Atualizado: 5 de set.
Nos últimos dias, o termo “adultização infantil” ganhou repercussão intensa nas redes sociais e chegou ao Congresso Nacional, impulsionado pelo vídeo do youtuber Felca. Nele, o influenciador denuncia a exposição precoce de crianças a conteúdos e comportamentos que deveriam ser restritos ao universo adulto, com um recorte que vai desde influenciadores mirins que falam sobre investimentos até adolescentes reproduzindo falas, coreografias e atitudes de cunho sexualizado.

A Fundação Abrinq define adultização como a antecipação de comportamentos e expectativas da vida adulta para crianças, o que inclui:
Uso precoce de roupas e maquiagens com apelo sexual;
Reproduzir falas, gestos e coreografias de teor erótico;
Acesso irrestrito a músicas, vídeos e influenciadores com conteúdo sexual;
Pressão social para “parecer mais velho” a fim de ser aceito.
No vídeo, Felca alterna entre ironia e seriedade, mas reforça críticas à postura de pais e responsáveis, alertando para os riscos do contato precoce com certos conteúdos.
A discussão, que começou no YouTube, rapidamente se ampliou: como equilibrar liberdade de expressão, autonomia digital e proteção da infância?
Essa é uma questão que já foi enfrentada por outros países, e a China oferece um exemplo de abordagem regulatória que combina leis rígidas, interpretações judiciais e medidas tecnológicas.
O modelo chinês de proteção infantil online
A China estruturou um sistema que envolve várias frentes, para lidar com crimes e riscos envolvendo crianças na internet. Essa atuação se baseia em cinco eixos principais:
1. Proteção contra pornografia e conteúdos nocivos
Desde 2000, com a “Decisão do Comitê Permanente da Assembleia Popular Nacional sobre a Salvaguarda da Segurança na Internet”, a produção e disseminação de material pornográfico são criminalizadas, especialmente quando envolvem menores. Interpretações do Supremo Tribunal Popular e da Suprema Procuradoria (2004 e 2010) reforçam punições severas para quem criar, vender ou distribuir conteúdo sexual com menores de 18 anos.
A versão de 2010 reduziu pela metade a quantidade mínima de publicações necessárias para condenar quem produza conteúdo com menores de 14 anos, um endurecimento claro para acelerar responsabilizações. As proibições legais também abrangem a divulgação de cultos e superstições, entendidos como nocivos à ordem social, incluindo responsabilização criminal para disseminação online.
2. Proteção da privacidade e identidade de menores
As leis chinesas, como a Lei de Proteção de Menores e a Lei de Processo Penal, determinam que crimes cometidos por menores não sejam julgados publicamente e que nenhuma informação de identificação (nome, endereço, fotos) possa ser divulgada antes do julgamento.
A Lei de Prevenção da Delinquência Juvenil vai além: proíbe a divulgação desses dados em qualquer momento, mesmo após a conclusão do caso, buscando reduzir estigmas e favorecer a reintegração social.
3. Combate a fraudes e golpes online envolvendo crianças
Casos de falsos pedidos de doações explorando doenças graves de crianças levaram o governo a regulamentar rigidamente o setor. Desde a Lei da Caridade (2016) e os Regulamentos sobre a Gestão dos Serviços de Plataforma de Arrecadação Pública de Fundos, apenas plataformas credenciadas pelo Departamento de Assuntos Civis podem intermediar doações. Elas devem verificar a autenticidade das campanhas e alertar o público sobre riscos.
4. Prevenção de vícios digitais e exposição a conteúdo prejudicial
Empresas como a Kuaishou implementaram um programa chamado “Crescimento Feliz” (Happy Growth), com medidas como:
Educação digital sobre uso consciente da internet;
Controle parental integrado, restringindo transmissões ao vivo, cobranças e saques para menores;
Alertas anti-vício para limitar tempo de uso;
Identificação automática de menores;
Sistema de classificação de vídeos em parceria com universidades, para atacar a raiz do consumo excessivo.
5. Uso da tecnologia para encontrar crianças desaparecidas
Projetos como o serviço “Online Person Finder” de Cao Jinsheng já ajudaram a localizar mais de 600 idosos e crianças desaparecidas via redes sociais como Weibo e WeChat. Em 2015, o governo lançou a Plataforma Nacional de Informações sobre Crianças Desaparecidas, que planeja integrar reconhecimento facial e blockchain para criar perfis digitais à prova de adulteração. Medidas fundamentais no combate ao tráfico de menores.
Entre liberdade e segurança: o que o Brasil pode aprender
O debate brasileiro sobre o caso Felca expõe a ausência de mecanismos claros e eficazes para regular o acesso de crianças à internet. Enquanto isso, a China aplica uma estrutura legal que combina prevenção, punição e apoio tecnológico, articulando Estado, empresas e sociedade civil em um mesmo eixo.
Embora o contexto sociocultural chinês seja distinto e muitos elementos que são considerados importantes lá, aqui são compreendidos de outra maneira, a experiência mostra que regulação não significa censura indiscriminada, mas pode funcionar como instrumento de proteção integral.
No cenário atual, em que a exploração e a adultização infantil encontram espaço nas redes, adotar elementos dessa abordagem pode ser um passo decisivo para proteger as próximas gerações.
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