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quinta-feira, 31 de julho de 2025

Políticas públicas para minorias étnicas na China: unidade, diversidade e contradições

A China, reconhecida oficialmente como um estado multinacional (ou multiétnico, como prefiro dizer), abriga 56 grupos étnicos minoritários além da maioria Han. A relação entre o Estado chinês e essas minorias étnicas é marcada por uma política complexa, na qual a busca pela unidade nacional e pela estabilidade estatal se expressa no princípio de “unidade na diversidade” (多元一体 duoyuan yiti). Essa abordagem revela uma tensão constante, no entanto, esperado e comum em muitos países, entre reconhecimento da diferença, integração nacional e desafios geopolíticos. 

Contexto histórico: da Revolução à retomada da diversidade

Com a fundação da República Popular da China em 1949, o Partido Comunista Chinês (PCC) adotou uma postura inspirada nas concepções soviéticas de nacionalidades. No início o compromisso era com a igualdade entre os grupos étnicos e a inclusão das chamadas “nacionalidades minoritárias” (shaoshu minzu), com o objetivo de suprimir o chauvinismo Han e promover o progresso das minorias. 

Esse projeto, no entanto, sofreu rupturas durante a Revolução Cultural, quando práticas de assimilação cultural foram intensificadas e o mandarim padronizado (putonghua) tornou-se a língua central da nova China. As línguas e práticas das minorias passaram a ser desvalorizadas em nome de uma revolução marxista que, na prática, priorizava a unidade sob o comando Han.

No período pós-Mao, principalmente a partir dos anos 1980, junto do movimento de abertura comercial, houve um retorno ao reconhecimento formal dos direitos culturais das minorias.

As políticas passaram a valorizar a estabilidade econômica e a distribuição mais equitativa da riqueza, como forma de legitimar o Estado e reduzir desigualdades históricas.

Pilares das políticas étnicas atuais: autonomia, preferências e identidade 

Arcabouço legal e autonomia regional

A Constituição chinesa estabelece, em seu Artigo 4º, o princípio da equidade étnica e da unidade nacional, garantindo os direitos às minorias quanto ao uso de suas línguas, práticas e costumes. A autonomia regional, formalizada em regiões como Xinjiang, Tibete, Mongólia Interior, Ningxia e Guangxi, visa conferir algum grau de autogestão administrativa. 

Porém, alguns autores destacam que, na prática, a autonomia dessas regiões é limitada: cargos de decisão seguem majoritariamente sob domínio Han, sobretudo nos níveis partidários superiores, o que restringiria a efetividade do poder local das minorias.

Políticas preferenciais e ações afirmativas

Desde os anos 1980, políticas de ação afirmativa buscam mitigar desigualdades, estabelecendo cotas em universidades e benefícios fiscais. Tais medidas, embora reconheçam a necessidade de corrigir distorções históricas, geram controvérsias: de um lado, promovem oportunidades para populações periféricas; de outro, reforçam a percepção de diferença e alimentam debates sobre "sinicização" e assimilação cultural, mais do que sobre genuíno apoio à diversidade.

Política linguística e desafios práticos

Embora a constituição chinesa garanta o direito das minorias de usar e desenvolver suas línguas, a ênfase crescente no putonghua (mandarim padrão) nas escolas e na vida pública sinaliza uma tendência de monocultura linguística, mesmo que não seja uma política de governo. 

Representação das minorias étnicas China: festival cultural destaca unidade na diversidade (etnicidade na China, Chinese ethnic anthropology, 中国少数民族) Nino Rhamos
Mapa da diversidade linguística na China

Alguns acabam associando o domínio do mandarim à prosperidade e à modernidade, transformando as línguas minoritárias em símbolos tanto de riqueza cultural quanto de obstáculos ao desenvolvimento.  Críticos, mesmo assim, afirmam que isso ocorre incentivado pelo governo, resultando em declínio das línguas minoritárias e experiências de alienação, especialmente entre estudantes de regiões autônomas.

Desenvolvimento econômico, pobreza e estabilidade

Embora existam acusações ao Estado chinês, o desenvolvimento econômico e o alívio da pobreza são pilares centrais na política para as minorias étnicas na China. Grandes investimentos em infraestrutura, habitação e turismo são direcionados para regiões de maioria não-Han. 

Projetos como a “Uma Faixa, Uma Rota” visam criar derramamentos econômicos em áreas como Xinjiang, elevando os padrões de vida e garantindo a estabilidade. Campanhas de erradicação da pobreza, amplamente divulgadas pelo governo, são apresentadas como prova do sucesso do modelo chinês de integração e promoção do benefício comum.

Cultura, identidade e "sinicização"

O conceito de “unidade na diversidade”, cunhado pelo renomado sociólogo e antropólogo chinês, Fei Xiaotong (1910–2005), foi central para a construção de uma compreensão sobre como deveriam ser tratadas as diferenças em comunhão com uma identidade nacional.  

Sob Xi Jinping, existe um forte interesse na integração de todas as etnias sob uma identidade nacional chinesa. Esse processo, que também recebe críticas por soar como uma tendência à assimilação, é acompanhado pelo posicionamento das minorias como parte de uma “grande família”.

A gestão das políticas étnicas na China eventualmente recebe críticas externas envolvendo supostas tensões separatistas em regiões como Tibete, Xinjiang. Tais críticas apontam abusos, “colonialismo interno” e uma tendência estatal de despolitizar a etnicidade em prol da unidade nacional. Para os críticos, apesar do discurso de valorização da diversidade, persiste o predomínio da identidade Han como referência, atribuindo às minorias formas exóticas ou subordinadas.

Entre o modelo chinês e a crítica Ocidental

Dentro dessa dinâmica complexa entre grupos minoritários e a maioria Han, envolve também, termos consciência das premissas por trás dos argumentos. Para isso, compreender que Estados nacionais possuem representações simbólicas diferentes em cada país, é fundamental. 

Todos os Estados, embora tidos como semelhantes por respeitarem a uma aparente padronização institucional, foram construídos a partir de um processo histórico em que a modernidade impunha tal forma de organização social/institucional. Porém, a articulação com elementos socioculturais prévios, também existiu. O resultado dessa "dialética" são Estados com características próprias e que, por isso, causam incômodos por não atenderem a determinados padrões geopolíticos estabelecidos como norma por décadas.

A abordagem chinesa ao tema da etnicidade, nesse sentido, desafia o ideal normativo de Estado nacional pautado no individualismo liberal ocidental. Isso provoca críticas de setores que consideram o modelo chinês autoritário ou incompatível com princípios humanistas universais. Por outro lado, é preciso reconhecer que o padrão ocidental também se construiu a partir de lógicas excludentes e autoritárias, como o racismo científico e políticas de assimilação forçada em colônias e Estados-nação europeus, aspecto frequentemente silenciado no debate público internacional.

Ao acusar a China de violar direitos humanos ou suprimir identidades, parte do discurso global se apoia no pressuposto de que o liberalismo é a única via legítima para o desenvolvimento humano, tornando a diferença, por si só, alvo de desconfiança ou rejeição. Isso não significa ignorar possíveis violações e problemas na implementação das políticas étnicas chinesas, mas aponta para a necessidade de evitar julgamentos ancorados exclusivamente em valores normativos importados, que, paradoxalmente, podem ser tão autoritários quanto aqueles que criticam.

Assim, as políticas públicas chinesas para as minorias étnicas constituem um sistema híbrido de ação afirmativa e autonomia nominal. Uma orientação que não necessariamente se ancora em uma matriz marxista e mais por conceitos como minzu zhuyi e tradições dinásticas; embora a Revolução Popular de 1949, que fundou a República Popular da China, tenha considerado tais políticas inclusivas objetivamente. O Estado, nesse sentido, busca integrar, promover o desenvolvimento econômico e manter a unidade nacional, enquanto precisam dialogar também com as críticas que ressoam pela "comunidade internacional".

Por fim, ao invés de simplesmente classificar o modelo chinês como exceção ou desvio, é necessário compreendermos as suas lógicas internas, reconhecendo seus méritos e limitações, e relativizando leituras que partem de pressupostos normativos universais. Mais uma vez afirmo, o que não necessariamente implica fechar os olhos para possíveis problemas entre o Estado e os grupos minoritários, mas apresentá-las como questões a serem trabalhadas pelo governo chinês, ao invés de serem artifícios para um ataque ao sistema político do país. Assim, a discussão sobre etnicidade na China exige menos respostas fáceis e mais disposição para lidar com ambiguidades, contradições e múltiplas escalas de pertencimento.


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Temas abordados:

Etnicidade na China; minorias étnicas China; antropologia China; Chinese ethnic anthropology; unidade na diversidade; autonomia regional; sinicização; ação afirmativa; desenvolvimento econômico em regiões minoritárias; 中国少数民族.


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Nino Rhamos

Nino Rhamos é escritor e pesquisador independente. Tem mais de 30 anos de interesse pela China e formação acadêmica em antropologia. Atua desde 2010 com edição de vídeo e, mais recentemente, com tradução textual intercultural e consultoria em temas relacionados à China.

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